11 de março de 2012

Ieper Fest 2002

Eu gosto de olhar para trás e recordar experiências que tenha vivido, não é de agora. Ao longo dos anos tenho mantido o hábito de ir escrevendo diários ou resumos das minhas viagens que, consoante o tempo passa, vão valendo bem mais que "uma imagem". Foi há dez anos atrás que fiz a minha primeira viagem a sério. No ano em que fiz 21 anos fui com o João e com o Atum até à Bélgica para ver o clássico Ieper Fest. O cartaz tinha alguns nomes de luxo que me faziam querer marcar presença, desse por onde desse. Não só isso, mas também a fome de viver algo novo e diferente. Curiosamente, esta foi também a primeira vez que andei de avião! Olhando agora para trás, parece que foi há séculos!
Escrevi este texto depois de ter voltado e, embora tenha tido que o melhorar para ser publicado, a base está toda como eu a escrevi originalmente (tirando uma meia dúzia de apontamentos de puto parvo que não faziam grande sentido e foram retirados). É uma boa forma de celebrar os dez anos de aventura que a vida que eu escolhi me ofereceu até agora, só espero que assim o continue a ser. Um brinde aos próximos dez!


DIA 1 - 16/08/2002
O telefone tocou por volta das cinco e meia da manhã, era o Atum a conferir que eu já estava acordado. O meu pai foi-me pôr ao aeroporto. Tivemos alguns problemas no check-in por causa da autorização dos pais dele (é o que dá ter 16 anos!) mas no fim acabou por se resolver tudo pelo melhor. Esta foi a primeira vez que andei de avião. Gostei de descolar e da experiência no geral mas pensei que os aviões fossem mais sofisticados. Fiquei um bocado desiludido com isso.
Passadas cerca de duas horas e tal chegámos a Bruxelas e fomos apanhar o comboio para Ieper. Foi fixe porque deu para andar aos saltos dentro da carruagem e a fazer trinta por uma linha. O melhor foi termos passado em Kortrijk (cidade crucial para qualquer fã de metalcore da H8000!). Eles não paravam de me chatear que Congress ia tocar naquela noite. Ouvi, repetidamente, "André, André tamos a chegar à terra onde Congress vai tocar!"Enfim… que chatos!

Saímos em Ieper e, como bons miúdos do hardcore que somos, decidimos seguir uns tipos que também aparentavam ir para o parque de campismo do festival. Lá chegámos, com mais ou menos jeito. Mal chegámos, com alguma sede, decidimos comprar água na máquinas das bebidas. Não foi até ao primeiro trago que percebi a água era gaseificada. Quase vomitei. A partir daí só Coca-Cola! Montámos a tenda, pagámos pelo aluguer do espaço e fomo-nos encontrar com os Pointing Finger, que estavam em tour e iam tocar nessa edição do festival. Fomos a pé até ao recinto e chegámos lá na altura de Smut Peddlers, que era um punk rock burro e chato que não me despertou grande interesse. Depois deles tocaram os Die My Demon e… wow! Foi o meu primeiro contacto visual com os mosh pits da H8000 e fiquei louco. Também gostei da banda, a ver se arranjo alguma coisa deles para ouvir. Seguiram-se os Pretty Girls Make Graves mas o som não faz bem o meu género e, como tal, não posso dizer que tenha gostado. Estava algo curioso para ver os Jr Ewing, que iam a tocar a seguir, e não fiquei desapontado quando tocaram músicas do primeiro disco. Depois tocaram os New Born, uma banda que o Atum adora mas que me deixou 300% indiferente. Como vão acabar não creio que valha a pena esforçar-me para gostar. O concerto de Born From Pain foi BRUTAL! Adorei! Eu adoro Born From Pain, é muito bom. Demasiado bom! Pode ser que venham a Portugal em Dezembro (isso é que era). A fechar a noite, tocaram os Congress. Estava (mais que) curioso para os ver ao vivo e adorei, claro. Sou fã do metalcore da H8000, nunca o neguei. Gostei do novo vocalista, o Tim. Ele tem boa energia ao vivo e é incansável. Basta dizer que começaram com uma intro instrumental (bem épica, diga-se) que foi seguida da The Release, dá para imaginar? Foi lindo, muito mesmo.
Depois de Congress acabar de tocar fomos até ao centro da cidade para levantar dinheiro e dar uma volta antes de voltar para o parque de campismo. Apesar de tudo estar a correr bem, eu estava a começar a ficar com o nariz entupido e isso não era nada bom.

DIA 2 - 17/08/2002
Bom dia Ieper! Acordei cedo, depois de uma noite muito mal dormida graças a uns alemães e uns ingleses que não se calaram a noite toda. O meu nariz estava todo entupido, o que não ajudou à festa. Fomos tomar banho às casas de banho do parque e soube-nos bastante bem, principalmente por estarmos num estado já relativamente imundo. Fomos ao supermercado comprar gauffres e qualquer coisa para beber. Eu optei por um batido manhoso, mas que estava bom. Comemos tudo, deitámos fora as embalagens e seguimos para o festival. Percorremos o trajecto a pé e pusemo-nos lá nuns dez ou quinze minutos. Quando lá chegámos, sentámo-nos cá fora na relva a descansar porque ainda faltava mais de uma hora para o festival começar. Acabámos por adormecer lá durante algum tempo. Entretanto comecei a pingar do nariz e chateei o Atum e o João para irmos lá para dentro (até porque eu precisava de um guardanapo para me assoar). Entrámos sem problema e fomos vendos as bancas de merch até começarem os concertos.

O dia começou com os Dead Stop, old school rápido que não me convenceu muito - se calhar porque estava às compras e mal ouvi o som deles. Depois vieram os Burn Hollywood Burn e os Nothing Gold Can Stay, não gostei de nenhuma das duas (até porque a descrição diferia bastante da do folheto). Não achei Burn Hollywood Burn "aquela malha" de que o Atum falava. Degradation seguiu-se e tive a vê-los lá à frente com o Diogo. Não gostei muito. Já tinha ouvido três músicas deles e estava à espera de mais do concerto - a meio já estava farto. A seguir vieram os Severance e os Trial By Fire, que já não me lembro como era o som mas não devo ter gostado. Depois, pronto, é o que se sabe… Algo que eu ansiava ver: Length of Time! E que brutalidade de concerto que foi. A voz dele é boa, o som é bom, é tudo bom. Ele não se cansa de pedir acção no mosh pit, circle pits e crowd surf. Gostei muito, embora algumas músicas tenham lá partes bem gay! O vocalista às vezes faz lembrar o palonço dos System Of A Down mas que se lixe, foi um grande concerto. Vi pessoal a moshar nas partes sem ritmo das músicas (bom demais!) e até vi miúdas a dançar no meio do mosh pit. Bom.

Depois disso fomos comprar bebidas até à bomba de gasolina que havia lá pertinho e onde ficámos sentados a comer e a beber. Por causa disso acabámos por perder The Deal, uma banda que eu até queria ver mas que… não deu! No entanto, muita coisa boa ainda estava por acontecer. Voltámos para o recinto, onde os Cast Down tomavam conta do palco. Era um rock manhoso na onda de Hot Water Music e As Friends Rust, duas bandas que me dizem muito pouco. O Atum decidiu adormecer antes da banda seguinte - os Sunrise, da Polónia - que são uma grande banda e deram um concerto igualmente grande (em qualidade!). Seguiu-se Square One, que era muito mau e deu para dormir um pouco lá na relva. Estava ansioso para ver Darkest Hour porque tínhamos lido umas reviews que diziam muito bem deles e dos concertos deles, muito bem mesmo!. Entretanto começaram a tocar uns tipos chamados Majority Rule, que tocavam algo na onda dos Dillinger Escape Plan, ou seja, bom à primeira música e secante a partir da segunda. O pessoal lá à frente estava todo a adorar mas eu não gostei muito, queria mesmo era ver Darkest Hour.

Darkest Hour começou e foi a loucura, até me passei. De vez em quando ia olhando para o Atum e o pensamento esbatia-se no olhar: esta banda era MUITO boa! Primeiro chegaram todo o material para a frente do palco, tocando na parte mais pequena do mesmo. Tinham um dinossauro que fazia stage dives e fizeram uma pirâmide humana numa das músicas. Só sabe quem viu, e quem viu adorou! Depois vieram os Strike Anywhere, hardcore mais old school. O pessoal português que lá estava gostou imenso mas a mim passou um bocado ao lado, o que queria mesmo ver era Heaven Shall Burn. Quando eles começaram a tocar foi o delírio também. Estava em cima do palco, que estava completamente cheio e com toda a gente a cantar as músicas. Adorei. O melhor foi na última música - To Inherit The Guilt - o vocalista ter-me passado o microfone lá numa parte antes do fim e eu tê-la cantado (claro que fiquei afónico pouco tempo depois). Que concerto dos diabos! Acho que vai ser um daqueles de que nunca me vou esquecer.
Como estávamos um bocado cansados decidimo-nos ir embora. Ainda fomos ao centro da cidade levantar dinheiro antes de voltar ao parque de campismo para ir dormir.


DIA 3 - 18/08/2002
Como é acordar com a voz toda lixada? Ou com o nariz todo entupido? E com um indício de constipação em cima?! Ah! Este foi o último dia do festival. Acordei todo virado do avesso, todo mesmo. Saímos da tenda e fomos dar uma volta pelo centro da cidade. Não perdemos muito tempo nisso porque os Pointing Finger iam abrir as hostilidades e nós queríamos marcar presença. Chegámos lá e ainda os vimos a montar o material no palco antes do concerto, que foi muito fixe. Estavam cerca de quarenta ou cinquenta pessoas na audiência a curtir. O ponto alto, como sempre neste tipo de festival, foram as covers. Estava à espera que fosse bem pior! Eu adoro Pointing Finger e eles estão com um line up mesmo fixe. Pena que já não toquem músicas das demos; eram as melhores, as mais sinceras. Enfim, não se pode ter tudo. Ficam as boas memórias dos concertos que vi em Faro.
Quando o concerto deles acabou, fiquei logo no palco para ver a banda que ia tocar a seguir, os Absone. O concerto foi muito bom, gostei muito. Já tinha decidido que não ia comprar mais nada mas tive que abrir uma excepção para o LP deles. Só não conhecia uma das músicas que eles tocaram. Juntamente com Fear My Thoughts e Sunrise foram das bandas que eu conhecia pouco e estava curioso para ver - não tendo ficado nada desapontado.
Depois vieram os Between The Lines e os Zaccharia, que foram relativamente interessantes. A primeira era puro hardcore nova-iorquino e a segunda era um hardcore mais pesado e gritado. Seguiram-se os Fear My Thoughts, que deram um óptimo concerto. Os guitarristas tocam muito mesmo! Até me passei. O som é brutal de si, então com um violino (e uma violinista!) e duas guitarras daquelas não dá mesmo hipótese. Vieram depois três bandas que não me disseram assim muito. Foram os Let It Burn, os Flatcat e os Sworn In. O que eu queria ver veio a seguir, sob o nome de Deformity. Mais metalcore clássico da H8000 que, infelizmente, não me convenceu. Foi o concerto mais parado do festival inteiro. Gostei porque sou fã da banda e o guitarrista toca muito, de resto foi meio chato e sem reacção por parte do público. Seguiram-se os Point of no Return que acabaram por não ser aquilo de que eu estava à espera. Espera mais energia, mais qualquer coisa… Mas mesmo assim foi um bom concerto. Acho que tinha as expectativas demasiado altas.


Durante a banda seguinte, os Amulet, aconteceu algo inesperado: Do nada, começou a cair um temporal que metia medo ao susto. Juro! Foi o caos! Foi tudo para cima do palco ou para baixo dos toldos. Só parou de chover duas bandas depois, em As Friends Rust. O João e o Atum gostaram imenso do concerto por isso deve ter sido fixe. Eu vim-me embora para o parque de campismo com o pessoal de What Went Wrong na altura em que Circle estava a tocar uma cover de Sick Of It All. Quando lá cheguei já não chovia, mas as tendas estavam todas alagadas. Estive a arrumar tudo mais ou menos bem e, uma vez despachado, acabei por adormecer. Estava todo partido, muito cansado, sem voz e meio doente. Eles chegaram algum tempo depois e decidimos arrumar tudo logo e ir para a estação, uma vez que não valia a pena ficarmos ali mais uma noite, desconfortáveis.
Fartámo-nos de andar até chegar à estação e pelo caminho fomos presenciando várias cenas bizarras que passaram por ruas com uma névoa ao fundo, janelas partidas com as cortinas de fora e barulhos em jardins. Quando chegámos à estação fui com o João beber uma Coca-Cola (acho que nunca bebi tanta Coca-Cola em tão pouco tempo na minha vida) e ver o que tínhamos comprado no festival. Começou a chover meio de repente e tivemos que puxar tudo à pressa para baixo de uma cobertura que havia lá. Pouco tempo depois adormeci ao pé do Atum, no chão. O João acordou-nos por volta das quatro da manhã para dizer que o comboio era às quatro e meia. Fomos para Bruxelas onde ainda ficámos uma noite, voltando para Lisboa no dia seguinte. O cansaço que trouxemos de volta era imensurável mas o sorriso na cara não enganava ninguém: a missão tinha sido cumprida.

2 comentários:

Leandro Afonso disse...

o melhor é escreveres que nao ligaste a dead stop... ai se fosse hoje!!!

André disse...

ahah, mesmo. e nem sei se foi nesse que tambem tocou career suicide. ai jesua. que metaleiro.